MERCADO

Agravamento das condições fiscais e dos juros deve impactar setores dependentes de crédito

Atualizado em 22 setembro, 2020

Apesar dos sinais positivos de retomada na atividade econômica, ainda há muitas incertezas sobre o futuro, especialmente em relação às contas públicas. As despesas extraordinárias relacionadas à crise econômica e pandemia de COVID-19 foram operadas através de um regime fiscal, financeiro e de contratações denominado “Orçamento de Guerra” (EC 106/20), que flexibiliza e agiliza a execução de despesas durante a calamidade pública. Associado a isso, importantes medidas como o auxílio emergencial, direcionado principalmente aos trabalhadores informais, e o benefício emergencial, voltado para a manutenção do emprego e renda, também pressionam aquele que já é o maior déficit primário registrado na série histórica, cujas projeções atuais indicam que ultrapassará os R$ 800 bilhões e 10% do PIB em 2020.

Em agosto, o Tesouro Nacional apresentou problemas de liquidez que o levou a captar recursos diretamente do Banco Central na ordem de R$ 325 bilhões para adequar suas reservas de emergência. O perfil da dívida também tem tido seu prazo encurtado, com a emissão de títulos com vencimento menor, como forma de atrair mais investidores reduzindo seu risco, mas que coloca pressões mais imediatas sobre os pagamentos do Tesouro nos próximos meses. Esse quadro fiscal tem se tornado cada vez mais preocupante. A política monetária do Banco Central reduziu através de diversos cortes consecutivos a taxa básica de juros para o seu menor nível da série histórica, de 2,0% ao ano, o que também diminui os custos financeiros associados à dívida pública.

Com a manutenção desta taxa em setembro, porém, observaram-se problemas na captação de recursos através da emissão de títulos públicos, o que indica que o investidor está precificando riscos mais elevados que requerem uma rentabilidade maior do que a que está sendo oferecida atualmente. Essa percepção acerca do risco fiscal também começa a afetar o sistema de depósitos interbancários (DI), que serve para equilibrar os balanços dos Bancos. A taxa que incide sobre esses depósitos geralmente acompanha a Selic, porém observou nestes últimos dias um aumento após tais desenvolvimentos, o que acendeu mais um sinal de alerta para o mercado de crédito e a curva de juros.

Impactos na construção civil

Setores dependentes de crédito, especialmente de investimento massivo, podem ser potencialmente mais impactados por esse agravamento das condições fiscais e dos juros, como é o caso da Construção Civil, refletindo diretamente no segmento de materiais de construção. Na Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), referente a julho, o volume de vendas acumulado em 2020 recuperou níveis positivos (2,7%). Desde o ano passado, o setor tem presenciado um boom relacionado à redução das taxas de juros reais, o que auxiliou a conter o impacto gerado pela crise atual. Problemas, porém, começaram a aparecer nos últimos meses (especialmente a partir de julho) devido ao aumento no preço de insumos e temores relacionados à elevação dos juros, que já impactaram negativamente as expectativas do mercado financeiro para diversas empresas do setor.

O setor é considerado um dos principais na retomada econômica, sendo o segundo em termos de geração de empregos nos últimos dois meses (quase 59 mil vagas em junho e julho) no país e o terceiro em SC (atrás da Indústria e Comércio, gerando 1.688 vagas no período). O comércio ampliado de materiais de construção apresentou o maior crescimento nos últimos dois meses no estado e é um dos 4 grupamentos de atividade que já se encontra em patamar positivo no volume de vendas acumulado em 2020.

Esse cenário demonstra que o processo de retomada econômica requer ajustes e medidas tão importantes quanto aquelas adotadas na esteira do choque inicial. As propostas para reequilibrar as contas públicas, que geralmente têm considerado uma reforma tributária com elevação da carga na prática, podem se mostrar danosas num momento de frágil recuperação, especialmente do setor de serviços.

O foco neste momento deve ser a retomada sustentada da atividade econômica, especialmente ligada ao consumo das famílias e aos investimentos empresariais, para que a arrecadação fiscal seja uma consequência das medidas e não o objetivo. Dessa maneira, as reformas econômicas necessárias, como a tributária e administrativa, podem se concentrar na simplificação, desburocratização e melhoria do ambiente de negócios.

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